quarta-feira, 1 de outubro de 2014

Porque os franceses não usam Orkut...


Esse ainda é um blog sobre zueira. Um blog sobre brasileiros – que nasceram com a zueira no DNA – que estão no coração do mundo e têm que lidar com o fato de que aqui a zueira é coisa de selvagem, de bárbaro, ou (pior ainda) de Zé Povinho. Mas azar deles, porque a gente queria deixar também uma homenagem ao Orkut ("um beijo, Orkut, onde quer que você esteja"). E a ideia é muito simples, caros e caras leitores: mostrar porque o Orkut não tinha mesmo como funcionar com os franceses.

Primeiro: o mais óbvio, né? Falta zueira por aqui. Um francês nunca entraria numa comunidade “Anão vestido de palhaço mata oito”. Não é nem que eles não tenham senso de humor, mas quem lembra da comunidade sabe que ela se destinava a uma coletânea de manchetes bizarras de jornais e internet (como, por exemplo a que coroava a comunidade com a foto: “Búfalo mantém família refém por 8 horas”). Ainda não vimos nada que se parecesse com nossos jornais populares aqui. Os jornais são sérios. A política é séria. Até os programas de humor parecem sérios. E com tanta seriedade, como eles conseguiriam manchetes escabrosas e bizarras para o divertimento e procrastinação geral? (para mais comunidades, clique aqui)

Segundo: o pessoal aqui é muito direto em suas colocações.
 - Pardon, monsieur. Excuse-moi...s’il vous plait, vous parlez anglais ? Mon français n’est pas très bon et…
 - Non.

Ou seja, aqueles tópicos gigantescos do saudoso Orkut, com discussões infindáveis, não vingariam aqui. Existe um senso de objetividade entre os franceses que não importa qual pergunta a gente faça para as pessoas, as respostas são sempre muito diretas. Em certo momento, pensamos que isso era uma falta de gentileza, ou até mesmo uma grosseria. Até pode ser, mas a verdade é que eles não veem porque serem prolixos. Exceto na escrita.

Terceiro: eles não escutaram o pior (e o melhor) da música brasileira dos anos 90. Comunidades como “Tô fazendo amor com 8 pessoas”, “Drogas alternativas”, “Adoro Pepê e Neném”, “Pareço legal, mas sou pagodeiro”, “Não sei individualizar duplas” e tantas outras que remetem aos traumas auditivos sofridos por uma geração inteira (para mais comunidades, clique aqui).

Quarto: eles são excessivamente honestos. Sim, eles constantemente alertam para os pickpockets no metrô – o nosso popular “batedor de carteira”. Mas também! Essa gente anda com bolsa e mochila aberta o tempo todo, deixa elas nas mesas dos cafés enquanto vão ao banheiro, saem e deixam o pagamento em cima da mesa, sem conferir se o garçom pegou ou não... A gente fica pasmo! E aí a dúvida: como essa gente seria capaz de fazer um fake no Orkut? Fake, pra quem não lembra, era um perfil falso que as pessoas faziam para dar uma olhada naquele gatinho sem ele saber que você tava olhando ele. Ou algo assim. Alguns faziam os fake só por zueira mesmo, fazendo perfis de artistas, celebridades e até mesmo de amigos que já tinham perfil no Orkut. Claro que se você estivesse incomodado com algum fake, você podia clicar na opção “report as bogus”. Assim, o perfil falso era denunciado e avaliado por uma equipe de especialistas – e enquanto isso, a foto do perfil virava uma sombra atrás das grades. Muito bom gosto!



Quinto: eles não dariam valor a mecanismos sensacionais como os “depoimentos”. Além de objetivos, os franceses parecem não gostar dessas declarações públicas de afeto. Até agora, uma das coisas mais divertidas a se fazer num supermercado parisiense é tocar o braço de um nativo e ver a sua reação. Eles ficam realmente desconcertados! Toque físico, mesmo que seja um tapinha nas costas, é coisa de selvagem! Sendo assim, é claro que eles não gostariam de compartilhar publicamente um depoimento de 2048 caracteres sobre uma pessoa. É exposição demais, gente!

Sexto: O sistema do Orkut em ranquear as pessoas por categorias como “sexy”, “cool” e “confiável” não vingaria nunca numa sociedade onde as coisas não parecem ter tons de cinza. A ideia de que alguém seria 90% sexy, 70% legal e 80% confiável não passa pela cabeça dos franceses. Ao que tudo indica, aqui ou a pessoa seria 0%, ou seria 100%.

Sétimo: Talvez os franceses se adaptassem aos scraps, que era uma forma de comunicação rápida e direta pelo Orkut. Mas eles certamente não se adaptariam aos milhares de gifs que poluíam visualmente o Orkut. Aqui, a cafonice para ser aceita tem que ser pelo menos de dois séculos atrás. Gifs com animais da Disney, música, corações, fogos de artifício...tudo isso os franceses repudiariam com aquele olhar blasé tão típico.

Oitavo: Procrastinação não é a ordem do dia. Aqui se trabalha menos que o Brasil, é verdade, mas os franceses parecem pouco adeptos ao sentimento macunaímico do “ai, que preguiça!”. Comunidades como “Não fui eu, foi meu eu lírico”, “Niilismo miguxo”, “Grávida de Luís Carlos Prestes”, “Lenin de três”, “Odeio contaminação por lítio” não teriam apelo nenhum. Eles nunca perderiam tempo com isso quando poderiam ir a um café, ler um livro, ou simplesmente ver o movimento passar.


 No geral, as nossas experiências com os franceses têm sido tranquilas. Eles são atenciosos quando você faz a pergunta correta. Eles te dão bom dia, boa noite, boa jornada... Eles até sorriem quando falamos com eles (em francês). Mas adicionar eles no Orkut? Nem pensar.


(A Juliane sugeriu um título alternativo para esse post: "Porque o Orkut funcionou tão bem entre os brasileiros..." - apostem suas fichas!) 

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