sábado, 18 de outubro de 2014

Estudando em Paris

Nessa última semana conseguimos retomar o ritmo de estudos em Paris. A Juliane está fazendo uma disciplina na Paris 4 enquanto eu ando vendo algumas palestras. No geral, nos sobra bastante tempo para estudar fora da universidade - algo que parece ser comum entre os franceses. O lance aqui é menos sala de aula, mais estudo. Como operacionalizar isso? Isso a gente ainda não sabe. Mas o lance aqui é reparar principalmente na diferença da didática entre professores e alunos.

A aula aqui é, via de regra, uma palestra. A nossa ideia de aula expositiva e dialogada não costuma ser muito comum por aqui. O professor fala e você tem toda a liberdade para interagir, mas o que notamos é que entre os franceses DEUSULIVRE interromper o professor com alguma pergunta. Depois ele vai dar um tempo para isso. Como uma palestra. Nós somos acostumados com um estilo mais informal de aula, fruto talvez de uma geração que leu Paulo Freire - e os franceses não.

Mas é claro, isso não permite a gente a elencar o tipo de aula em qual é melhor e qual é pior. A vida acadêmica muda de realidade para realidade, mesmo que de forma sutil. Isso porque os códigos culturais de reverência ao saber são diferentes em cada situação e, portanto, a gente acaba adotando esses códigos ao longo da vida universitária. Se os franceses não primam pela informalidade, não dá para pensar que justamente no meio acadêmico isso seria diferente. E, além disso, há o peso da tradição aqui: a Sorbonne foi criada em 1297. As diferentes unidades da Universidade de Paris carregam junto com isso o peso de mais 700 anos nas costas! Logo, o espaço da informalidade é bem limitado... No final das contas, a Sorbonne é muito mais tradicional que qualquer universidade brasileira. Por outro lado, o ensino nela é bem mais formal do que estamos habituados.

Há que se citar também o College de France. Imaginem isso: uma universidade aberta para todos que tiverem tempo para ver suas aulas. Ela foi criada em 1530 (cerca de 300 anos antes da primeira universidade brasileira) e atualmente seu objetivo é simples: oferecer cursos e seminários abertos para o público. Nessa última sexta-feira fui ver uma conferência da professora Michelle Perrot sobre a Primeira Guerra Mundial e o amor (o título era ótimo: "a guerra virou o amor de ponta cabeça", ou algo assim). Palestra sensacional, com uma historiadora sensacional, mas o mais interessante é que ela era no meio da tarde e estava lotada! Tirando estudantes de História, o que mais se destacava na audiência era uma enorme quantidade de velhinhos (e alguns poucos, mas representativos "loucos de palestra" também). Aposentados que, com o seu tempo livre, veem seminários e palestras, fazem cursos, participam das atividades culturais e intelectuais do College. Juro que me pilhei de fazer alguns cursos ("História Intelectual da China" e "História da Escrita na Europa Moderna", com o Roger Chartier).


Mas o mais legal que temos visto na nossa vidinha de estudantes em Paris tem sido as bibliotecas. Cada uma é um sonho maior do que a outra. A Gulbekian, que a Juliane já falou, tem sido a nossa favorita - tanto que temos cartões da dita cuja para tirar livros. Ela é uma biblioteca lusófona em Paris, ficando na fundação que tem o mesmo nome. Também tem a biblioteca do Centre d'Histoire Social, que é muito incrível porque tem um sensacional arquivo de documentos sindicais franceses e uma enorme coleção de estudos sobre a História do Trabalho (muito amor!). E essa semana, por sua vez, demos um pulo na biblioteca mais próxima do nosso distrito, a biblioteca municipal do 15éme. Admito que quando fomos lá, não consegui nem pensar em estudar dada a enorme quantidade de gibis e graphic novels da biblioteca. Mas na próxima vou dar uma estudada, vou sim...


Até porque, a vida de estudante em Paris é entrar em contato com tudo ao mesmo tempo. A impressão que passa é que não há ponto cego e que estamos, de fato, no coração do mundo. Que não há o que não queiramos saber que não possamos encontrar nessa cidade. É uma outra visão sobre o mundo do saber... mas se tivesse um pouquinho mais de zueira, seria perfeito!

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