sexta-feira, 31 de outubro de 2014

Rue Faubourg Saint-Denis - o lado oriental

Para ler com a trilha sonora de "Aventureiros do Bairro Proibido"...

Uma das ruas mais descoladinhas de Paris é a Rue Faubourg Saint-Denis. A gente foi conhecer ela ontem, graças a um post do excelente blog, Paris Lado B - que vira e mexe nos ajuda a nos locomover nas indiadas parisienses. O problema é que a gente pegou um caminho errado perto da Gare du Nord e quando vimos, fomos entrar numa Faubourg Saint-Denis que não é aquela descrita no modo de vida alternativo parisiense.

Na verdade, essa rua atravessa três bairros: o 3e, o 10e e o 18e. Ali por volta da boulevard Magenta, contudo, é que o bicho pega. Já falamos antes que a cidade de Paris é cheia de imigrantes e que em alguns bairros, como o 10e, o 11e, o 19e e o 20e meio que se misturam cultura alternativa e essa cultura imigrante. Entrecruzam-se um monte de narrativas, mas que geralmente parecem cair ou no imigrante africano, ou no imigrante árabe. Mas ontem, andando no lado "oriental" da Faubourg, vimos que a rua é também um centro da cultura indiana na França!

Uma cultura indiana, claro, com peculiaridades. Uma imensa quantidade de açougues halal (que são os açougues para carnes abatidas com a supervisão de um sacerdote islâmico) e os inúmeros restaurantes com temática paquistanesa e bangladeshiana indicam que é uma visão mais islamizada da cultura indiana que encontramos ali. Mas vou guiar vocês por essa parte - e no próximo post, a Juliane vai guiar vocês para a parte mais boêmia.

Descaradamente roubado do Google Street View, mas foi aí que tomamos nossa pint


No início, ela parecia ser só uma rua normal, com alguns fast food indicando o "verdadeiro sabor do oriente". Alguns metros adiante da Gare du Nord chegamos a sentar num café para tomar uma cerveja e o dono nos atendeu com sorrisos e gentilezas - sinal de que ele não era lá muito parisiense. A bebida com preço honesto nos fez seguir o caminho, esperançosos de que estávamos na tal parte boêmia; as lojas de roupas dizendo "o melhor de Bollywood" indicavam o contrário.

Pouco a pouco, nos deparamos com um bombardeio de cultura indiana. Uma cultura, de certa forma, levada ao extremo para marcar a posição dos imigrantes do bairro. Pimentas, que até então não encontrávamos, praticamente brotavam dos mercadinhos da rua. Os cheiros de temperos ocupavam boa parte do olfato. As lojas de vestido eram tão deslumbrantes que até agora não sabemos se eles eram feios ou bonitos. Cardápios e vitrines escritos em sânscrito, árabe e até em inglês. De vez em quando aparecia algo escrito em francês. Ainda estávamos em Paris?


Há que se salientar que essa é uma zona de imigração e, como era de se esperar, ela é mais pobre do que as regiões mais centrais. Consequentemente, há mais pobreza na rua, ainda que não se veja tanta miséria - não vimos moradores de rua, por exemplo. Por outro lado, quando paramos no café para tomar a sagrada cervejinha, a Juliane reparou que enquanto o bairro era tomado por indianos, as mulheres mesmo não ocupavam as ruas. As mulheres que passavam por nós geralmente eram brancas, tipicamente parisienses, ou turistas perdidas ali. Ficamos em dúvida o quanto essa cultura de imigrantes indianos em Paris não tinha também suas sutilezas em termos de sexismo. Em todos os bares/cafés pelos quais passamos, por exemplo, somente homens ocupavam as mesas.

Mercadinho indiano e cingalês
A partir do viaduto de La Chapelle, a rua muda de nome, vira a Marx-Dormoy, e é uma das entradas para o 18e, conhecido por ser mais popular (e abrigar a Sacre Coeur e o Moulin Rouge, região conhecida como Montmartre). No viaduto, indianos, árabes, africanos estão ali vendendo versões totalmente legítimas (bem, mais ou menos...) de eletrônicos. A partir dali, achamos que estávamos bem distantes da zona boêmia descrita nos guias para turistas (que só inclui aqueles pontos turísticos ali). Voltamos o caminho...e novos olhares assombrados para a petit Bombay parisiense.

O mais legal desse passeio, claro, foi encontrar essa gama de culturas perdidas na selva de pedra que é Paris. Eles não fazem parte de nenhuma narrativa normal sobre a cidade (que destaca somente a imigração africana ou árabe), mas sim de algo que até então não sabíamos que existia: uma zona de imigrantes de origem indiana (e paquistanesa, e nepalesa, e bangladeshiana e até cingalesa - que é quem vem do Sri Lanka). Isso, sem dúvida, faz de uma capital como Paris realmente cosmopolitaine, como eles gostam de dizer.

Bollywood hindu dvd
Por outro lado, esses enclaves de imigrantes são curiosos. Demonstram também a dificuldade de inserção de quem vem de uma cultura diferente para o coração da França. Se a nossa dificuldade em se habituar com Paris é grande, o que dirá dessa galera que nem sempre é familiar com o francês, que não tem recursos e que tá ali em busca de uma vida com melhores condições materiais? Já nos falaram antes que os imigrantes aqui costumam ficar muito entre eles...e de uma forma bastante inusitada, descobrimos isso na parte "oriental" de uma das ruas mais boemias de Paris. O que é uma prova de que flanar por essa cidade é conhecer um pouquinho do mundo.

quinta-feira, 30 de outubro de 2014

Homenageando a Catalunha - parte II

Continuamos hoje a parte II do texto do Guinter sobre o procés catalão de autonomia. O texto é muito bom e a primeira parte foi ontem, para quem perdeu (é só clicar aqui , calma). Vale para entender até mesmo a nossa dificuldade, enquanto brasileiro do sul para compreender os separatismos sem cair em xenofobias e doidices afins. Um baita texto e que vale salientar: ele e as fotos são obras exclusivas do próprio Guinter: a gente só cedeu o espaço e, é claro, foi uma honra. :)

Começando por uma questão comum a tod@s: a atitude do Estado espanhol em se mostrar totalmente avesso à consulta, algo percebido como antidemocrático, em que pese as garantias de autonomia previstas na sua constituição, tem acirrado em muito as posições. Isto é, acima de tudo, querem poder simplesmente ter a possibilidade de decidir, mesmo que para dizer não à independência. Isso por si só evidenciaria a fragilidade do exercício democrático no Reino da Espanha.

Agora, para além disso, as coisas começam a ficar mais complexas. O primeiro com quem conversei mais detidamente foi um estudante de Educação Social da UdG (Universitat de Girona), no meu segundo dia em Girona. Estavam fazendo uma greve, mantendo por dois dias fechado o campus Barri Vell (que concentra os cursos de Humanas, como não poderia deixar de ser). Perguntei quem de fato defendia a independência. Me disse que havia diferentes grupos políticos, inclusive mais à direita, mas que mais seriamente a esquerda catalã (em suas diferentes tendências). Para Mas e a CiU, segundo ele de centro-direita, era apenas uma forma importante de garantir votos nas próximas eleições (oportunismo eleitoral, a gente também vê por aqui...). Na esquerda, os grupos rupturistas não compõem a campanha pelo referendo, porque defendem que uma independência política não necessariamente traz mudanças sociais. Já ele, outros grupos e partidos (como a Ezquerra Republicana, que tem deputados na Generalitat e que é o atual favorito segundo as pesquisas para a próxima eleição de presidente do órgão), entendem ser importante discutir e promover o referendo, mesmo que aliando-se momentaneamente com grupos de centro e centro-direita, e ainda que ele também entenda a importância de aproximar às questões políticas as pautas sociais (como o crescente  problema de despejos de famílias pobres e de classe média baixa, que perderam suas casas com a crise).


O segundo grupo com o qual conversei eram alguns professores da UdG, incluindo minha orientadora aqui, a professora Rosa Congost. Gentilmente me convidaram para um café, querendo saber mais sobre as eleições brasileiras (especialmente sobre o fenômeno Marina Silva), mas igualmente sobre como eu - apenas um rapaz latino-americano com alguns euros no bolso – via toda esta questão política da Catalunha. Respondi que achava muito interessante, mas que ainda estava aprendendo a respeito. Uma pergunta, no entanto, me chamou a atenção: se na América Latina havia simpatia com a causa catalã pelo fato de supostamente compartilharmos uma “experiência colonial” em comum, quer dizer, como sofrendo também do imperialismo castelhano. Bom, argumentei que, ao menos no Brasil, com exceção de pessoas mais interessadas sobre o tema (ou do público da História), a população em geral desconhece as diferenças internas da Espanha. Então, a Conquista e a exploração coloniais estão associadas ao espanhol genérico, sem considerar as diversas nações dentro da Espanha. Logo, brincaram sobre essa questão de que aqui só existe a Catalunha e mais nada. E a respeito da independência em si, tinham posições mais moderadas, não tendo certeza se seria um bom negócio, embora seguramente que se identificassem como catalães e não como espanhóis. Possivelmente por serem mais velhos, estejam mais desiludidos com toda a questão...

A última conversa que destaco foi com um dos meus companheiros de casa: trinta e poucos anos, engenheiro de recursos renováveis, ativo na militância dentro da sua área, assinante de um jornal produzido em Barcelona bancado por movimentos sociais. Ele me argumentou que, basicamente, o Estado espanhol é um “desastre”, em diferentes sentidos. Apesar de no papel - ou seja, na constituição – serem garantidos às comunidades autônomas espanholas níveis de soberania relativa a diferentes elementos (especialmente de língua, lembrando que não apenas o idioma falado na Catalunha é distinto do castelhano, mas também o galego e o basco, este sim completamente diferente), na prática o Estado espanhol ceifa uma série de direitos. Por exemplo, afirma que deve-se “espanholizar” as crianças catalãs, pois a aprendizagem do catalão prejudicaria seu domínio do castelhano (lembre-se de que os catalães são educados em ambas as línguas). O argumento da Catalunha como uma das últimas “colônias” de Castela também apareceu em sua fala. Por outro lado, os indivíduos que têm ocupados os principais cargos políticos no governo espanhol estão vinculados direta ou indiretamente ao período franquista, sendo filhos ou netos de generais e de outros colaboradores da ditadura (algo que tristemente nos soa familiar...). 

Por último, ressaltou que o argumento fiscal/econômico também importa. (Aliás, talvez o principal argumento abraçado pelas forças mais conservadoras da Catalunha que estão na aliança política pelo referendo). Atualmente, a Catalunha é responsável por cerca de 20% do PIB espanhol, recebendo no entanto bem menos do que isso. Ok, aqui está uma pauta que para nós mais se aproxima de uma visão mais reacionária do separatismo. “Produzimos mais riquezas, mas recebemos muito menos”. O meu companheiro de casa argumentou que isso tem um efeito a médio prazo de quebrar a economia catalã. De fato, não ficou claro para mim, talvez lost in translation, qual sua opinião acerca disso, ou se este é um argumento mais válido para a causa independentista. Contudo, disse que, no caso de uma separação da Catalunha em relação à Espanha, a primeira com certeza absorveria boa parte da dívida espanhola, o que seria benéfico a outras regiões. Resumindo, a questão é complexa, é não se pode reduzir a causa independentista a um único fator. Como qualquer questão histórica.


Bueno, é uma questão difícil de se compreender para um novato como eu. Se posicionar com clareza, ainda mais. O elemento econômico/fiscal, muito ressaltado pelas redes de notícias, ou ao menos pela TVE, principal canal de televisão, soa demasiado familiar, muito próximo ao argumento das elites brasileiras, e especialmente gaúchas e paulistas, sobre como trabalham tanto e são responsáveis pela riqueza produzida no país, mas que são aviltados pelos “pobres” e “vagabundos” concessionários da Bolsa-Família nordestinos. Na Espanha, geograficamente o Norte/Nordeste cultural e econômico seria o sul, a Andaluzia. Por isso, a pulga permanece atrás da minha orelha.

Contudo, também me parece verdadeiro, até o momento, que os principais defensores de uma soberania/independência estão situados mais à esquerda. E também me parece certo que a experiência do regime franquista, que proibia o uso do catalão em espaços públicos, e mesmo em cartas particulares, contribuiu para o reforço de uma identidade catalã como uma identidade política, acima de tudo. Franco, os fascistas espanhóis e a Guerra Civil de 1936-1939 implicaram uma ruptura no processo de mobilização social e política que vivia toda a Espanha naquele momento com a República. O discurso da unidade da nação espanhola, alimentado fortemente pela religião católica e o “espanholismo” (que na verdade era um “castelhanismo” disfarçado) reprimiu violentamente não apenas quaisquer discursos e práticas de contestação social, mas também - algo mui significativo para os espanhóis como um todo - as diferentes expressões nacionais que compõem o país. (O Museu de História de Girona tem uma seção muito legal só sobre a República e os seus levantes, e a cidade como um todo tem alguns espaços de memória das vítimas do franquismo). Desse modo, ao meu ver, apesar de fincar profundas raízes históricas, que remontam ao início da Idade Moderna, não precisamos voltar até a união das coroas dos reis católicos de Castela e Aragão no século XVI para compreender a briga dos catalães contra o Estado espanhol; creio que a experiência franquista dá muito o tom das expressões políticas que se têm hoje. Sob este argumento, a causa soberanista/independentista catalã me parece muito simpática, e com certeza, contaria com uma adesão imediata de minha parte.


O grande problema é como traduzir identidades e experiências políticas de um país para outro. Acho que não precisaríamos de uma pesquisa para saber que grande parte dos que hoje falam em separação do Sul/Sudeste do Brasil em relação ao Norte/Nordeste – ou do Rio Grande do Sul em relação ao resto do país - são os mesmos que relativizam a ditadura, ou inclusive defendem abertamente a sua volta, os mesmos que ressuscitam o argumento do “fantasma comunista” e por aí vai. Isto é, assumem claramente posições de direita, conservadoras, reacionárias. (É claro que, a não ser no período pós-independência e de formação do Estado brasileiro no século XIX, processo fortemente centralista, não existiram movimentos separatistas realmente sérios no país). Já aqui, o buraco é mais embaixo. E enquanto alguém identificado como politicamente “de esquerda”, isso me inquieta. A princípio, empresto minha simpatia à causa catalã, ainda que não tenha clareza sobre isso, especialmente sobre qual deveria ser seu destino, um Estado dentro da Espanha, ou separado do reino. Mas decidir sobre isso não cabe a mim, cabe aos catalães. Continuarei buscando a aprender sobre, e refinar minha posição, acompanhando de perto o procés...


PS: as informações e dados históricos, especialmente sobre os grupos políticos da Generalitat, foram extraídos de fontes de Internet e de minha absorção das informações de jornais e televisão; é possível que tenha me equivocado sobre algumas caracterizações, então sugiro consulta a outras fontes!

quarta-feira, 29 de outubro de 2014

Homenageando a Catalunha - parte I

O texto de hoje foi feito pelo amigo Guinter, que, assim como a gente, encontra-se desterrado fazendo doutorado sanduíche. Ele está na cidade de Girona, na Catalunha, e escreve aqui sobre algo que os jornais brasileiros tão deixando passar batido: o referendo pela Independência da Catalunha. Um texto de muita qualidade, com bastante reflexão e tem até uma zueirinha, porque ninguém é de ferro.  A gente dividiu ele em duas partes, para os leitores irem acompanhando com calma e dando uma olhada numa realidade diferente da nossa, mas com olhos atentos e mente aberta. Com a palavra, o nosso correspondente além-Pirineus. :)

Procurando entender independências sérias (e outras nem tanto): a Catalunha e seu procés

Bom, há algum tempo que vinha pensando em escrever minhas impressões e reflexões sobre a Catalunha e seu momento político. Mas lembrei que não tinha um blog ou coisa do gênero. Aí, neste momento que em terras brasileiras a nossa desprezível elite, tacanha como sempre, fala em separar o país em dois, Sul/Sudeste e Norte/Nordeste, resolvi escrever, lembrando que tenho grandes amigos que têm um blog sobre suas impressões a respeito da França. Ju e Fer, valeu pelo espaço concedido!

Estou na Catalunha há três semanas. Ou melhor, em Girona. Deve ser a terceira ou quarta cidade em tamanho na Catalunha, contando com um pouco menos de cem mil habitantes. O centro da cidade e seus arredores é bem movimentado, e o bairro histórico é muito legal, preservando inclusive uma boa extensão de muralhas do período romano/carolíngio/medieval. Sem contar museus, o parque da Devesa, e as Fires de Sant Narciss, festa local com atrações durante toda esta semana.

Bem, estou aqui há menos de um mês, ainda não conheci Barcelona (além de seu aeroporto) ou outras cidades catalãs, muito menos outras regiões da Espanha. Mas pelo convívio diário com pessoas e outras experiências, o slogan Catalunya no és Espanya começa a fazer sentido pra mim...


Creio que não haveria um melhor momento político para experienciar os particularismos catalães e suas traduções políticas. Nesses últimos meses, têm se vivido por aqui o Procés que deve – ou deveria – culminar no dia 9 de novembro, o 9N, uma consulta pela qual a população da Comunidade Autônoma da Catalunha (o Reino da Espanha, desde a constituição pós-Franco de 1978, é composto pelas comunidades autônomas, unidades políticas com relativo grau de autonomia) deve responder “sim” ou “não” a duas perguntas: 1) quer que a Catalunha seja um Estado? e 2) se sim, quer que seja independente? Ou seja, os catalães têm a possibilidade, por meio de um referendo, de decidir sobre uma questão que historicamente os têm mobilizado.


Para resumir rapidamente: a proposta de referendo foi ratificada no final de 2012 por Artur Mas, da CiU (Convergencia i Unió), presidente do parlamento catalão, a Genaralitat. No entanto, o governo central espanhol, encabeçado pelo presidente Mariano Rajoy, do PP (Partido Popular), recentemente respondeu com a impossibilidade de realização do referendo, alegando sua inconstitucionalidade. Não preciso nem dizer como os catalães chiaram. Como resposta, depois de algumas vacilações, o governo da Generalitat, através de Mas, garantiu que o referendo será realizado, mesmo que informalmente.

Antes de chegar aqui, já sabia alguns poucos elementos a respeito do sentimento de identidade catalã, e suas desavenças com a Espanha, mais especificamente com Madri. No entanto, me impressionou quando do primeiro dia em Girona, o número de bandeiras da Catalunha penduradas nas janelas, assim como mensagens que afirmavam o desejo de poder votar no 9N e a intransigência do governo espanhol.


Mas uma pergunta ficou matutando na minha cabeça: a pauta soberanista/independentista dos catalães é levantada por quais grupos no espectro político? Ou melhor: é uma causa conservadora, uma patriotada (o último refúgio dos canalhas, consultar história do Brasil), ou uma demanda de soberania e autonomia, mais progressista? Bom, como brasileiros, sabemos de fato o que é viver em um país muito diverso culturalmente. Só que essas diferenças não traduzem concretamente a ideia de sentimentos nacionais sufocados por uma unidade maior chamada de República Federativa do Brasil. Temos dialetos muito diversos e ricos, mas todos falamos português. (Talvez em termos linguísticos, algo parecido de idiomas minoritariamente falados diga respeito às comunidades indígenas, especialmente no que tange a seus direitos de receber sua educação em suas línguas originais). Além do mais, vindo do Rio Grande do Sul, eternamente desconfio da linguagem do separatismo, pois claramente se manifesta como uma pauta conservadora, preconceituosa e xenófoba. (O cenário imediato pós derrota eleitoral da direita no Brasil escancara isso). Por isso a pulga me coçava muito atrás da orelha...

Então, fui atrás de mais informações na Internet, textos e reportagens de canais (sérios) de mídia digital. (Recomendo especialmente uma entrevista com o historiador Josep Fontana, no site português Esquerda.net ). Mas acima de tudo, me pus a conversar com pessoas com as quais fui me envolvendo aqui em Girona. No hostel, nos restaurantes, na universidade, com os amigos que tenho feito...

(continuarà...)

terça-feira, 28 de outubro de 2014

Comprando roupas "pas cher" em Paris

Primeiro, uma explicação de ordem linguística: aqui, quando você quer algo mais barato, você não diz "mais barato" e sim "não caro" = "pas cher". Ás vezes aparece um "moins cher", mais a expressão mais usada é o "pas cher" mesmo.

Segundo: eu vou colocar alguns preços em euros no texto. Ao invés de converter (o euro está uns 3,12 reais hoje), use outro raciocínio, mas eficaz: o valor do salário mínimo. Na França, um pouco mais de 1400 euros; no Brasil, convertendo, o salário mínimo é 228 euros . 

Dito isso, o texto de hoje:

Antes de fazermos nossos malas para virmos para cá, nos informamos via internet e amigos sobre que roupas levar. Pela internet descobrimos que as nossas roupas de frio não servem muito para cá, já que aqui é BEM mais frio do que Porto Alegre (estamos no outono e tem feito entre 10/15 graus, mas todos nos garantem que já era para estar uns 4 graus, no outono). Assim, trouxemos pouquíssimas roupas pensando em comprar por aqui. Além disso, os relatos sempre forma de que as roupas aqui são bem mais baratas que aí.

Dessa forma, com poucas roupas e poucas roupas para enfrentar o inverno deles, há umas semanas atrás fomos até a Rivoli, uma rua no 1e onde você pode encontrar as grandes lojas de departamentos, desde as mais baratas até as mais caras. Entre elas temos a nossa conhecida C&A (bem mais barata aqui), a Forever 21 (rede americana que inaugurou aqui há pouco tempo) e a H&M (queridinha de muitos brasileiros). Nesse "passeio", conseguimos algumas coisas de preço menor para o inverno: luvas, botinha com pelúcia (Brasil: mais de 100 reais; C&A francesa: 9 euros) e um ou outro blusão levinho barato (12, 10, 8 euros).

O Fernando é o pão duro do casal (para roupas), e queria achar lugares mais baratos para poder comprar o seu "Doudoune" (é o casaco mais indicado para o frio daqui, já que ele não deixa o frio entrar nem o calor sair - os mais quentes têm pena de ganso no forro).

Doudoune
Pesquisando pelas pechinchas parisienses, chegamos até a loja Sympa. Conversando com a zeladora, chegamos até o Boulevard Rouchechouart (pertinho da Sacré Coeur, entre o 9e e o 18e). E acabamos por descobrir que os dois lugares eram praticamente um só, já que a loja, que na verdade são lojas, é no boulevard.

Uma das "Sympa"
A Sympa é conhecida pelos preços baixos e pelo produtos de marca baratérrimos (Ralph Lauren e cia.). O problema é que o negócio é meio bagunçado mesmo (você precisa realmente achar a agulha no palheiro) e somente em uma das lojas tem provedor (e eles não fazem trocas). Assim, é bom para comprar casacos e blusões, por exemplo, ou meias, roupas íntimas, cachecóis, que não precisam de um provador. Havia calças bem baratas, mas sem experimentar, difícil. Saias a mesma coisa (e por 5 euros!).  Mas para achar tudo isso você precisa sobreviver a isso:




A parte masculina é super interessante, com casacos bem bacanas (claro que a qualidade não deve ser uma maravilha, mas eu já tive experiências bem desastrosas pagando caro no Brasil, então, vale a tentativa) e blusões de cashmere bem baratos. Um adendo: eles adoram blusões de cashmere por aqui, já que são quentinho e não fazem volume. Via de regra é produto caro (não à toa o The Economist chamou um ato pró-Aécio de "Revolução do Cashmere"). Bem, na Sympa, pagamos 9 euros uma dessas, masculina.

Confesso que roupas femininas não gostei muito, mas não tive paciência para garimpar a fundo, mas consegui comprar meia-calça para o friozão por menos de 10 euros (e meia de "esquiador" por 5 euros!). Mas os casacos masculinos eram bem interessantes, alguns com um bom corte mesmo, só ter paciência de procurar tamanho. Explico: xs francesxs são bem magros, os homens em especial tem o que costumamos chamar no Brasil de "ombrinhos de frango", sabe? O Fernando, que se encaixa na categorização de "espadaúdo", teve que penar para achar um casaco que não ficasse apertado nos ombros. Olha onde ele teve que procurar (mentira, quem procurou fui eu):

E olha que fomos de manhã!
Quem procura acha..
Na primeira Sympa, não encontramos numeração, na segunda não tinha roupa masculina, mas na terceira (ufa!), achamos: por míseros 25 euros um doudoune para aguentar o frio que se aproxima. Acho que não tem penas de ganso, mas já ajuda (imagine um salário mínimo de 1400 euros e um casaco de 25? Pechincha!). Nas lojas de departamento, por menos de 40 euros não havíamos encontrado.

Para quem gosta de garimpo e de preços baixos, é um ótimo lugar. Em uma das lojas há roupas infantis e sapatos, mas os últimos achamos caros (você encontra MUITO mais barato em outras lojas do boulevard). O local é meio conhecido pelos batedores de carteira (é zona super turística), mas não tivemos problemas algum.

A lateral de uma das lojas: cestão na rua mesmo!

Roupas íntimas masculinas.


Calças da Ralph Lauren, todos juram que são originais.

Como chegar lá? Estação Pigalle ou Anvers, depois é seguir pelo boulevard.

PS: Estamos à espera do texto de nosso correspondente além-Pirineus para dar um relato sobre o referendo na Catalunha. Fiquem ligados no blog, pois teremos participação especial logo logo! :)

segunda-feira, 27 de outubro de 2014

Colonialismo francês - parte III

Domingo, dia de passeio - ainda mais quando a gente não queria ficar roendo as unhas por causa das eleições no Brasil. Então, depois de muito incomodar a Juliane, a gente acabou indo no Museu de l'Armée francesa no antigo Hotel dos Invalides, onde também fica o túmulo de Napoleão. O Hotel é um desbunde só, é gigante e lindo e começou a ser construído no século XVII pelo Luís XIV (o cara do "O Estado sou eu") para servir como uma espécie de hospital destinado aos veteranos de guerra (os invalides). E mesmo diante de tanta Revolução, o Hotel abriga ainda a imagem do Luís XIV em seu pórtico.


Demos uma boa volta no museu e vimos também uma exposição com representações da Primeira Guerra Mundial. Um passeio que não foi exatamente barato, mas que pelo menos a gente tinha uma expectativa de que fosse diferente. Cabe salientar, contudo, que aqui na França - assim como em outros países - o tema da História Militar geralmente é apropriado por gente que ama de paixão o Exército e tá louca para ter um milico para chamar de seu. Geralmente essas visões muito militaristas perdem de vista algumas revoltas populares e o papel dos Exércitos no massacre delas...mas chegaremos lá.

Sobre o museu, dá para dizer que ele cansa um pouco e não só pelo tamanho. É porque ele segue o estilo de memorabília mesmo, ou seja, é um monte de objetos colocados para você apreciar e em diferentes contextos. Por exemplo: canhões. Desde os primeiros canhões, usados no século XIV pelo Exército francês, até a artilharia anti-tanques da Segunda Guerra Mundial, tudo está ali no museu. No início achei muito legal ver...tem uns desenhos que mostram inclusive o uso das armas na guerra medieval. Mas depois de ver o quinquagésimo canhão, a gente tem que respirar fundo e seguir em frente. O mesmo valia para as armaduras medievais, para as espadas, para as lanças...tudo isso era um tanto quanto cansativo depois de um tempo. Mesmo nas armas da Era Moderna e da Era Napoleônica, o que mais se via eram fardas de soldados, armas, armaduras, essas coisas. Depois de um tempo já cansava.


O próprio Napô deixa um pouco a desejar. O seu túmulo fica na catedral dos invalides e é colossal. Muito bonito, mas tirando uma voltinha dentro dele e uma eventual reverência ao desgraçado personagem histórico mais famoso do século XIX, o lance era voltar para o museu mesmo. A exposição da Primeira Guerra também era meio cansativa...muitos quadros legais, mas pouca organização, fazendo com que eles fossem colocados sempre ao lado de armamentos e sem muita problematização política e social.

Mas o ponto mais drástico do museu foi sem dúvida o dos apagamentos. A História da França é cheia de momentos onde o Exército e as classes populares se debateram e se apoiaram. Em 1792, em meio à Revolução Francesa, os líderes jacobinos promulgaram o governo da Convenção e deram armas para o povo para que eles enfrentassem juntos os invasores externos vindos da Áustria. Esfarrapado e com fome, milhares de franceses aceitaram isso porque o novo Exército era uma forma de ascensão social e de prestígio numa sociedade que recém arrebentava seus laços feudais. E no final das contas, poucas menções aos soldados sans cullotes.

Há que se lembrar também que os franceses tomaram um belíssimo pau em várias guerras, mas uma das mais significativas foi a Revolução Haitiana, que perdurou de 1792 a 1802 e garantiu a primeira independência na América a libertar, de fato, os escravos. Enquanto o museu tinha uma sala toda dedicada à "Revolução Americana", a "Revolução Haitiana", em que os escravos pegaram em armas contra os opressores franceses, não tinha absolutamente nenhuma menção.

Em 1871, após a França ter sido derrotada pela Prússia na Guerra Franco-Prussiana, os operários parisienses decidiram proteger-se da invasão e pegaram em armas. Cansados da guerra, proclamaram um novo governo: a Comuna de Paris. Porém, o novo regime francês (a Terceira República) decidiu acabar com a Comuna e durante semanas a cidade de Paris foi bombardeada e incendiada pelo seu próprio Exército. Como era de se esperar, nenhuma menção a isso no museu.

Antes da Primeira Guerra Mundial, o deputado socialista Jean Jaurés se colocou contra a guerra que se avizinhava e após um inflamado discurso pacifista, foi baleado por um nacionalista francês. Semanas depois, os soldados franceses marchavam cantando a "Marselhesa". 1,7 milhões de franceses mortos. Nada sobre os pacifistas e os soldados que se recusavam a lutar (vejam o filme "Glória Feita de Sangue", de Stanley Kubrick).

Na Guerra Civil Espanhola, a França socialista declarou-se neutra no conflito, embora tenha abrigado militantes anarquistas e socialistas que fugiam da ditadura franquista. Na Segunda Guerra Mundial, a resistência francesa contou com um papel decisivo dos comunistas. Nada disso é citado.

Mas o mais zueiro dos apagamentos franceses é a parte sobre imperialismo e colônias. No século XIX há menção do imperialismo francês e uma demonstração de armas e comportamentos dos soldados coloniais. Mas nada de autocrítica. Nem uma vírgula. A França colonizou boa parte do mundo entre os séculos XIX e XX, mas as referências são mais para dizer que isso aconteceu. Isso não é motivo de vergonha, não há um mea culpa. Há somente uma longa exibição de armas e trajes militares. E, é claro, de cartazes de propaganda da metrópole francesa conclamando os povos colonizados a lutarem pela França - de 1840 a 1950. Nada sobre a guerra criminosa empreendida pelos franceses na Argélia, nada sobre os massacres ocorridos na África Ocidental. Apagamento.

A Juliane falou ontem que isso tem a ver, mais uma vez, com a forma como os franceses se percebem na sua narrativa histórico-identitária. Ou seja, se no Brasil a gente vê a colonização como uma chaga a ser superada, na França ela é só um episódio. Eles não celebram mais ela (até 1931 eles faziam "exposições coloniais"), mas não quer dizer que critiquem. Passou. Como as colunas romanas, como o túmulo de Napoleão, como a Belle Époque... Um passado não-recuperável porque, nesse caso, não interessa para eles.


domingo, 26 de outubro de 2014

Segura, Berenice...

Mais um domingo de eleições. Hoje, ao contrário do domingo do primeiro turno, não ficamos em casa o dia todo. Aproveitamos, passeamos, espairecemos e chegamos agora pouco. A outra novidade é que entramos no horário de inverno na França. Estamos a apenas 3 horas de distância do Brasil agora, o que é ótimo para acompanhar o segundo turno.

A gente já falou de segundo turno várias vezes. A gente falou aquiaquiaqui também (claro) e quem prestou atenção, viu que falamos aqui aussi. Então a gente decidiu que hoje não é dia de falar nada. Que as urnas falem.

Bonne chance para quem não quer retrocesso. ;)


sábado, 25 de outubro de 2014

Grávida de Luís Carlos Prestes

Desde que chegamos aqui tem me chamado a atenção a quantidade de crianças e de mães jovens pela rua. E não falo de mães/pais com um bebê, ou uma criança já grande, falo de casais com duas, três, quatro crianças, no melhor estilo "escadinha". Algo comum por aqui, inclusive, são os carrinhos duplos (que só lembro de ter visto no Brasil no caso de gêmeos, ou seja, é raro) que levam duas crianças de idades diferentes, mas com pouca diferença.

Primeiro achei que eu podia estar exagerando, que seria uma falsa impressão a quantidade ""assustadora"" de crianças, mas conversando com o Fernando ele concordou. Nossa primeira hipótese foi a educação e a saúde pública de qualidade, assim é muito mais fácil ter um filho. Depois problematizamos que isso poderia ser uma marca do nosso bairro, o 15e, de classe média/média alta, com poucos imigrantes, com alto poder aquisitivo, essas coisas.


Ontem tivemos a oportunidade de conversar com uma imigrante portuguesa que vive aqui há bastante tempo e nos foi bastante esclarecedor. A maioria das reflexões que faço aqui partem então dessa conversa, e de conversas com brasileiros que também moram aqui há muito tempo. Assim, nosso parâmetro é Paris, já que há variações por região (e renda) na ajuda dada pelo governo. Associo o texto de hoje também ao texto de ontem, sobre o "bolsa família" daqui, que não é um, são muitos.

Saúde

O sistema de saúde público, que todos são obrigados a ter, é conhecido por ser de altíssima qualidade e funcionar muito bem. Se você precisar fazer uma consulta você paga ao seu médico algo em torno de 28 euros, dinheiro que será ressarcido pelo governo, diretamente na sua conta, em cerca de 5 dias.  Pelos relatos, o sistema já foi melhor, cobrindo 100% de todos os custos com saúde, hoje ele cobriria uns 80%, o que para nossa experiência já seria um sonho.

Vacina para gripe? Paga pelo Estado. 

Cirurgia de redução de estômago? Paga pelo Estado. Mas o mais interessante é que todas as cirurgias reparadoras (consideradas estéticas no Brasil), são pagas pelo Estado também, já que são entendidas como parte do "pacote" da cirurgia: dessa forma, a cirurgia plástica vai para a conta do Estado. Assim como são entendidas como parte do pacote "acessórios" pós cirúrgicos: em uma cirurgia de retirada de nódulos mamários, por exemplo, você precisa usar um sutiã especial que aqui custa em torno de 80 euros. Pago pelo Estado. 

E sistema de saúde privado, tem? Tem, ele serve para dar conta daquilo que não é abarcado pelo público. Um plano de saúde privado para uma família (pais com mais de 40 anos e criança), sai por uns 170 euros mensais. Entre as vantagens apontadas está o fato de você ficar em um quarto individual (o público é com quarto coletivo). Fiz uma simulação de preços no site da Unimed de São Paulo e um plano para mim e para o Fernando sai em torno de 412,12. Em euros: 131,46. Esse seria o plano mais barato, com abrangência regional, obstetrícia e internação na enfermaria. Agora faça o cálculo mais lógico: o salário mínimo daqui, arredondando, 1400 euros. O salário mínimo daí 230 euros. Que tal te parece a proporção?

Ah! E parece que médico aqui ganha como qualquer trabalhador, e é "gente como a gente" (citação).

Assistência Social

Aqui dona de casa tem direito à assistência social. Trabalhador também. Todo mundo tem. Trabalha-se pouco (a média francesa é de 35 horas semanais). O sistema de seguridade social francês é bem melhor que o INSS nosso-de-cada-dia, ao garantir que todos aqueles com problemas de saúde ganham seu pagamento integral - independente do empregador. Quando falamos que no Brasil é muito difícil de conseguir licença médica, ouvimos que a França garante isso por lei a todo mundo. E de fato, o empregador que não garantir licença médica a um funcionário pode ser duramente processado.

Mesmo quem está aposentado ou por invalidez mantém seus recursos intactos, garantindo entre 80 a 100% do seu salário integral mesmo quando não está trabalhando. Nos anos 90 e 2000 houve muita pressão para que se aliviasse a previdência social francesa, mas o fato é que ela é fortíssima e reforça essa ideia de que ela não é só para "pobre", mas sim para todos. Assim, todo francês é responsável pela manutenção da assistência social.

Educação

É pública, em sua grande maioria, do ensino básico ao ensino superior. Há escolas do básico privadas, geralmente confessionais, mas o que corre "à boca pequena" é que as públicas são melhores (mais ou menos como no Brasil sobre as universidades públicas/privadas).  Já universidades privadas são ainda mais raras e também estão ligadas ao catolicismo.

Fora isso, no que se refere ao ensino básico, os horários da escola são bastante interessantes: das 8:30 às 16h (ou 16:30, não tenho certeza). Dessa forma, você não precisa de uma babá, por exemplo, já que a criança fica o dia na escola. Se você precisar que ela fique um pouco mais, é possível também. Tudo público e laico. Assim, as crianças comem no refeitório da escola, e devem comer tudinho, inclusive a salada, pois há um fiscal para controlar isso. Que tal? Somado a isso, e partindo de um relato, o uso da cantina é pago, mas de acordo com a renda dos pais. De novo para quem não entendeu: o pagamento é proporcional à renda dos pais.

Filhos

Já que estamos falando dos pequenos: aqui a escola começa a partir dos 3 anos, se antes disso você quiser pagar uma babá (1500 euros), o Estado paga metade. O que parece ser muito comum aqui é duas famílias contratarem um babá (geralmente imigrantes) e dividirem ainda mais os gastos (e aumentarem o trabalho dela...)

Uma outra possibilidade é você não querer babás e resolver parar de trabalhar para poder cuidar dos seus filhos até os 3 anos: o Estado pagará para você uma "bolsa" até lá. Fora o fato que você recebe uma ajuda de custo para os filhos que você tem e algo em torno de 900 euros (pode ser mais ou menos dependendo da região e da renda) para poder comprar o enxoval do seu bebê e outros produtos considerados essenciais para a criança - desde que tenham preços acessíveis. O relato que tivemos foi de que o governo francês sempre trabalhou com a ideia de famílias com 3 filhos, e para que isso acontecesse facilitou e incentivou bastante a vida de todos que quisessem ter seus "bacuris e bacurias".

O que isso significa para mim?

Tenho 32 anos e não tenho filhos. As mães que eu vejo na rua, muitas com menos idade do que eu, têm 2, 3, 4 filhos (num verdadeiro exercício de malabarismo).  Quanto eu gastaria, no Brasil, para ter dois filhos? Plano de saúde e educação privada e uma jornada de trabalho extenuante para poder arcar com as despesas. Ou eu poderia usar o sistema público - que sabemos que tem problemas bem sérios. Seria temerário da minha parte depender unicamente do SUS, embora haja ótimos relatos do IPE no RS. Quanto à educação, há boas chances de conseguir escolarizar um filho por meio da escola pública (temos ótimas escolas federais, por exemplo) e se considerarmos o Ensino Superior, as federais botam no chinelo as universidades privadas. Mas a expansão da educação e da saúde privada no Brasil se deu (e ainda se dá) demolindo a qualidade daquilo que é público. E com isso a maioria das pessoas que têm renda suficiente migra para os serviços privados, se sentindo desresponsabilizada pelos serviços públicos, que por sua vez, vão ficando cada vez mais estigmatizados e recebem cada vez menos verbas. É uma bola de neve perigosa - que foi contida nos últimos 12 anos, mas que não deixou de existir.

Em síntese: viver num Estado de bem-estar social bem assentado é um sonho, já que ele garante direitos básicos a todos os seus cidadãos (eu disse TODOS, inclusive aqueles que ainda não têm essa cidadania garantida, como os imigrantes ilegais). O que isso significa na prática? Você tem acesso à saúde, educação, auxílios diversos, que garante que todos tenham condições de vida, pelo menos, dignas. e combate, assim, a desigualdade social. Claro que você só consegue isso com impostos, e com impostos que recaem cada vez mais nas classes altas, o que é muito justo.

Hoje a França vive talvez o seu pior momento, com uma altíssima divida pública e com desemprego bem maior do que o Brasil. Uma das alternativas proposta pela direita é a privatização de muitos desses serviços, o que é rejeitado pela maioria da população (pois essa grande maioria se beneficia do sistema público). A extrema-direita, mais malandra, se recusa a fazer isso, mas vai mais longe. Com um discurso xenófobo ("a culpa é dos imigrantes"), eles se propõem não a desmantelar o Estado de bem-estar social, mas sim tirar os imigrantes dele. Isso encontra eco numa parcela da população (principalmente no Norte, pelo que vimos em alguns adesivos colados no nosso bairro: "na Bretanha, empregue Bretões". Me-do). As esquerdas, por sua vez, falam que o governo pode (e deve) abrir mão do discurso de austeridade e ampliar ainda mais a tributação sobre as grandes fortunas francesas. Isso faz com que haja evasão de ricos, que acabam indo morar na Bélgica, Holanda, Espanha, Inglaterra. Os investimentos também minguam e, consequentemente, acaba aumentando ainda mais o desemprego. Uma solução proposta pela extrema-esquerda seria começar a encampar empresas para garantir que os empregos não diminuíssem.

E ainda dá para ter filhos aqui, mesmo diante desse cenário? Bom, a rigor, continua parecendo mais fácil constituir família aqui do que no Brasil. Enquanto verificamos o declínio econômico francês e suas consequências sociais, na nossa terra natal a gente vê exatamente o contrário. Mas ainda assim o abismo é grande.

O meu primeiro impulso depois de saber do funcionamento das coisas por aqui foi: "vou ter filhos e morar aqui para sempre!". Mas daí passei uma noite perambulando entre bares cheios de franceses bem franceses e me dei conta de uma coisa: vai que meu filho sai blasé também?!

Resumindo: desisti da ideia ;)



Bolsa Família na França

Te juro, eleitor brasileiro. Aqui tem bolsa família também. Eles chamam de outra coisa: um tal de RSA, Revenu de Solidarité Active, ou Renda Solidária Ativa. Para mim e para Juliane, daria mais ou menos uns 700 euros mensais. Chegamos a cogitar a ideia de solicitar, mas ficamos meio constrangidos..."pô, é chato, a gente economizou uma grana, tá super batalhando...será que vale se aproveitar dos caras?" Bom, esse é o nosso pensamento brazuca. Como sou cidadão europeu, daria para pedir bem tranquilamente. Mas não o fizemos.

A gente não fez porque a gente é brasileiro, de uma forma meio maluca. O primeiro programa de transferência de renda em âmbito nacional foi o bolsa família. Até hoje a gente vê gente chiando no Brasil porque o programa "sustenta vagabundo" (ou coisa do tipo). Caro amigo brasileiro, cara amiga brasileira, vamos deixar vocês bem tranquilos: saibam que na França, o RSA (o bolsa família deles) equivale basicamente a 2.100 reais. No Brasil, o bolsa família pode chegar no máximo a 200 reais (adicionando 70 reais por filho). Na França esse valor, como dissemos, chega fácil a 700 euros para um casal sem filhos (eu e a Ju). Isso dá mais ou menos metade de um salário mínimo francês. Se vocês acrescentarem aí o fato de que não se paga nem por saúde e nem por educação nessa terra, os gastos dos franceses e francesas são apenas os de aluguel, mobilidade urbana (amém, metrô) e alimentação.

E no Brasil? No Brasil, uma bolsa família mal dá para o sustento de uma família de fato. Tira eles da miséria, mas é preciso ainda muito mais. É preciso, claro, que a saúde e educação sejam gratuitas e boas o suficiente para garantir qualidade de vida ao cidadão. Mas para isso, lamento dizer, é preciso nivelar os salários de todo mundo. Aqui na França, um médico em início de carreira ganha cerca de 6 a 7 mil euros. Um salário mínimo francês é de cerca de 1200 euros. Amigo, o salário do médico francês em início de carreira é cerca de 6 vezes mais o salário mínimo. No Brasil, o Governo Federal oferece a médicos um salário de início de carreira de cerca de 10.000 reais se aceitarem participar do Programa Mais Médicos (a única contribuição compulsória dos médicos no sistema público de saúde). Isso equivale basicamente a cerca de 14 vezes o salário mínimo! Em início de carreira, voltamos a lembrar. E nem falemos de magistrados e políticos.

Mas o problema não passa só por eles. Amigo, experimenta sonegar imposto aqui na França. Sabe o que acontece? Se você sonegou menos do que 5% dos seus gastos, o juiz te chama e fica definido que você paga o não declarado. Mas caso a sonegação tenha sido maior...amigo, prepare-se: você pode ter que pagar até 80% a mais do valor do imposto. Sonegação aqui é algo sério e todo mundo tem que pagar por isso.

A gente nem consegue dizer que a França é o melhor dos mundos. Outros países tem melhores sistemas tributários e conseguem sociedades ainda mais igualitárias que os gauleses. Mas comparado com o Brasil, onde escapar do "leão" é sinônimo de malandragem, encarnação viva da lei de Gerson, aqui fica parecendo a Cuba socialista. Enquanto no Brasil alguns poucos podem gastar muito sem ter que arcar com qualquer responsabilidade por uma grande massa de pobres e miseráveis, aqui na França a ideia de "comunidade" pesa forte e os impostos são adequados a partir da realidade de manter a desigualdade sob controle.

No final das contas, me arrependo de não ter recorrido à assistência social francesa. Não é nenhum demérito. Faz sentido dentro de uma sociedade que se preocupa, minimamente, em não entrar em colapso. Mas em terra brasilis...sei não, tenho receio do que o próximo dia 26 de outubro possa nos apontar. 


quinta-feira, 23 de outubro de 2014

Cervejas em Paris

Os dias mais friozinhos do outono em Paris chegaram e a gente vai sentindo isso nas bebidas. Estamos tomando mais café, já tomamos até chocolate quente e a Ju...bem, ela segue tomando chimarrão. Mas a maior mudança tem sido reintroduzir o vinho nos nossos hábitos, deixando de lado a boa e velha cervejinha.

A própria Juliane descobriu que tem vinhos franceses que ela consegue tolerar. Se bobear, até curtir! É o caso dos vinhos do sudeste da França, em especial os de regiões mais mediterrâneas (como o Languedoc, Roussillon e até mesmo a ilha de Córsega). Ela não curtiu muito os Bordeaux (que são lá do sudoeste) e também não deu muita bola para o Bourgogne (que fica na parte mais leste). Aqui os vinhos são definidos pela região e geralmente dependem de alguma mistura de uvas, sendo mais raro tomar Cabernet, Merlot, Malbec, entre outros. Geralmente os vinhos que usam um tipo de uva só são mais meia boca, então é melhor se arriscar com as misturas mesmo.

E eu? Bom, como os amigos Pablo e Muriel lembram, eu sou mais da cerveja. E a vida de um cervejeiro em Paris não é de todo mal, mesmo que as más línguas me acusem de desperdício por não aproveitar os vinhos franceses.

Primeira coisa boa que a gente tem sobre a cerveja aqui é que ela é razoavelmente barata e tem boa qualidade. Uma marca como a Kronenberg, que é a mais famosa daqui, apresenta duas cervejas: a própria "Kronen" e a "1664", popularmente conhecida como "seize" (se lê "çézi"). A 1664 é mais cara, mas mais gostosa. Lembra bastante a Original, mas mais "gasosa", se é que isso é atributo de cerveja. Cerca de 10 garrafinhas de 250ml (ou 25cl como eles chamam aqui) sai por mais ou menos 7 euros (ou 21 reais). Sai mais ou menos a mesma coisa que comprar 5 Originais no Zaffari. A Kronen, por sua vez, é a que sai mais em conta, com a mesma quantidade de garrafinhas saindo por 5 euros. É a nossa preferida, porque sabe como é a contenção de gastos, né?

Uma massa e uma "çézi"

A segunda coisa boa que eu poderia apontar é a variedade. Assim como o Brasil dos últimos dez anos passou a ter estantes de cerveja cada vez mais completas no supermercado, aqui na França não é diferente. No super perto de casa chegamos a encontrar a Colorado, cerveja produzida em Ribeirão Preto! Eu não sou um grande fã dessa cerveja, mas como todo o brasileiro, me escorre uma lágrima de saudade sempre que a gente vê algo made in Brazil (bem, nem sempre...). Assim, temos à nossa disposição algumas cervejas belgas (paraíso da ceva), tchecas (nirvana da ceva) e alemãs (valhalla das cevas). E tem também americanas (Bud), portuguesas (SuperBock) e etc. As francesas acabam sendo a nossa opção mais frequente, porque o preço é mais em conta. Mas vez ou outra a gente dá uma olhada nas demais.

A terceira coisa é o formato da dona cerveja. Como eu disse antes, as garrafinhas de cerveja vem em formato de 25cl. Se quiser, dá para levar para casa as de 70cl. Mas aí elas já não são tão baratas e correm o risco de esquentar rápido. No final das contas, o modelo long neck é mais barato e uma alternativa praticamente adotada por todo mundo. Tem também latinhas de diferentes tamanhos (25, 33 e 50cl), mas aqui em casa a long neck é a mais pedida. E com a vantagem de que elas gelam mais rápido, é claro.

Pint de Stella - 4 euros perto de casa

A quarta coisa é para aqueles, como eu, que preferem tomar uma cervejinha na rua do que em casa. Isso é um tanto quanto desolador, gente...mas não tem cerveja barata nas ruas de Paris. Eventualmente saímos para ir nos bares mais descolados e chinelões da cidade (11éme) e o modelo mais comum de ceva aqui é o pint (ou a pression), como eles chamam o nosso adorado "chope". O deles é menos gasoso e tem menos espuma no geral. Não é ruim, pois depende da cerveja. Algumas são ótimas - tem um barzinho no 11éme que tem chope de Delirium por 5 euros no happy hour. Já outras são terríveis - tomamos um no Marais, em setembro, que custava 3 euros mas era horrível. Acho que era Lyonnaise o nome da dita cuja. A medida do pint varia aqui, sendo na maioria das vezes copos de 45 ou 50cl. Os preços podem variar conforme o local, mas se você está pagando mais de 5 euros o seu pint em Paris, tá pagando caro.

Une pint, svp

Outra característica da vida "cervejística" em Paris é que os bares tem happy hour. Com isso, há um horário mais adequado para tomar sua cervejinha e que não fica muito tarde. Paris, como a nossa excelentíssima Porto Alegre, não tem mais bares abertos depois da 0h. É possível ainda encontrar alguns bares abertos depois da 1h, mas são raros e somente ficam abertos no final de semana.

De resto, para quem gosta de vinho e comete a heresia de preferir cerveja (tipo eu), Paris dá opções aceitáveis. Não são baratas, claro, mas dá para o nosso bolso. A única coisa que faz falta é o pé sujo mesmo. Boteco aqui não é que nem no Brasil. E esse hábito bem brasileiro de descer ceva com uma mesa cheia de gente não parece ter aqui. Cada um pede sua pint e fica ali, de boa, sendo blasé. Se em terra brasilis a zueira geralmente pede cerveja, aqui em Paris a falta de zueira mostra exatamente porque eles preferem vinho. 

quarta-feira, 22 de outubro de 2014

Os jardins de Monet

Eu não chego a ser uma grande admiradora de flores, jardins e seus derivados, digo isso no sentido de que eu nem tenho plantas em casa face ao meu talento para matá-las. Também lembro que a matéria que eu mais detestava em Biologia era Botânica. Assim, a minha relação com jardins de maneira geral sempre foi meio distante. 

Mas chegando aqui, com os franceses tratando o assunto de maneira muito séria (ou seja, qualquer pracinha se transforma em um jardim lindo-de-morrer), acabei me descobrindo uma grande fã de jardins e suas flores. Assim, sempre que possível, gosto de visitar os jardins disponíveis nos roteiros turísticos e não turísticos. 

Antes de vir para Paris, já sabia que havia um jardim do Monet, em Giverny (70 km daqui), que me parecia lindíssimo: foi inspirado no seu jardim, que ele haveria pintado as famosas séries com as nenúfares/lotus/nymphaea (as plantas aquáticas que aparecem em seus quadros). Sempre achei estonteante essas pinturas e tive a oportunidade de ver algumas no Museu de l'Orangerie (museu que super recomendo). Em Giverny, poderíamos também visitar a casa em que morou o pintor e passear pelos espaços cobertos por flores de tirar o fôlego.

Reflets verts (presente no Orangerie)
Le Bassin aux Nymphéas (presente no Museu d'Orsay)

Disposição na Orangerie: paineis imensos!

Assim, somando a curiosidade quase fetichista de ver "ao vivo" o modelo de Monet e a nova paixão por jardins, resolvemos dar uma viajada de trem, que é outro aspecto positivo da viagem, já que era novidade para gente. E em 40 minutos estávamos lá: saindo de Paris fomos até Vernon e de lá pegamos um ônibus (10 minutos) até Giverny, na região da Normandia (na estação de trem tinha várias zoeirinhas com o clima chuvoso da região). Vale dizer que a cidade é minúscula e pelo jeito tudo gira em torno do jardim e da casa de Monet, por isso há uma série de hotéis em torno. 

Optamos por pegar o primeiro trem saindo daqui para podermos ver os jardins sem muita muvuca, assim saímos 8:20 min. e fomos praticamente a primeira leva de turistas a chegar. Assim que você entra, você passa pela lojinha, depois pela frente da casa e pelos jardins de flores, e por último o Jardim das Águas/Ponte Japonesa, que é a parte mais famosa e inspiradora dessas pinturas aí de cima. Nós pulamos essas etapas iniciais e fomos direto para a parte famosa, conseguindo pegar ela relativamente vazia. E só tenho uma coisa para dizer/escrever para vocês: BAH!

Isso é uma foto, só pra avisar.

O dia hoje estava particularmente frio, nosso primeiro frio de "renguear cusco" mesmo: temperatura de 9 graus, mas sensação térmica mais baixa com certeza (na Normandia é mais úmido, né?). Mas também com um solzinho leve, que não chegava a esquentar muito, mas iluminava que era uma maravilha. E a luz é tudo quando se trata de Monet, né? Comentamos que na primavera o jardim deve ser lindo em função das flores (muitas delas estavam caidinhas já), mas o outono, com as inúmeras tonalidades de verde/vermelho e a luz que lhe é própria, é matador.

Foto do laguinho do Monet

Vista essa parte, fomos para o meio das flores. Bom, daí é de entontecer de lindeza. Além de flores que eu particularmente não conheço, há aquelas que a gente (eu, uma nulidade em plantas) até conhece, como rosas, dálias, etc., mas, sinceramente, flores como as que eu tenho visto por aqui, para mim, são novidades. Elas são enormes, e lindas, e parecem de mentira. E não é uma rosa no roseiral que é assim: são quase todas! Não sei qual o adubo que eles usam, gente, mas alguém precisa importar para o Brasil. 

Lindeza!
Depois do Fernando brincar de National Geographic das flores (ele é o responsável pelas fotos e quem quiser ver mais fotos, a gente colocou elas aqui), fomos visitar a casa do Monet, que infelizmente não pudemos tirar fotos. A casa foi mantida mais ou menos intacta, pelo que se pode ver pelas fotos expostas, e super conservada, claro. Além dos objetos pessoais, há também a coleção de desenhos japoneses do pintor exposta pela casa. Mas o mais incrível foi imaginar o Monet acordando, abrindo a janela e dando de cara com aquela coleção de flores que ele tinha ali: a parte das flores fica exatamente em frente à casa e à janela do quarto. 

O que eu achei? Lindo-de-morrer³.

Monet, seu lindo!

Dica para turista: o passeio é curto, dá para fazer em um turno e é melhor que seja pela manhã para pegar o local mais vazio. É importante saber que de novembro a abril o jardim fecha em função do inverno. Fora isso, saindo de Paris é só pegar um trem Paris-Vernon (28,60 euros, ida e volta) na Gare Saint Lazare (você compra o bilhete lá mesmo). O primeiro trem sai 08:20 (o trajeto dele é Paris-Rouen) e você chega em Vernon em torno das 9:10 (os trens são bastante confortáveis, inclusive). De Vernon você pega um ônibus (8 euros ida e volta) até Giverny - para quem curte bici, dá para alugar uma magrelinha também. Lá, você compra o seu bilhete (9,50 euros) e voilá! Para voltar, é só ficar atento nos horários de retorno, tanto do ônibus quanto do trem (esse parece que é de duas em duas horas). Para comer, há alguns cafés/restaurantes em torno do jardim (mas para quem quer fazer turismo lowcost a dica é sempre levar um sanduíche baguete na mochila). 

PS: A segunda língua, depois do francês é claro, no jardim era o português (a terceira era o japonês!): cheguei a brincar com o Fernando que era uma excursão vinda direto daí, tamanho era o número de brazucas espalhados por Giverny. Quando fomos no Louvre também sentimos isso, e via de regra, é difícil a gente ficar muito tempo sem ver um brasileiro: eles estão nos pontos turísticos, nos bares, nos metros. Alguns são visivelmente turistas, outros são visivelmente estudantes como a gente (além dos imigrantes, claro), mas o importante é que são muitos. E uma pergunta tem ecoado no ar: será que nos anos 90 também era assim? #ogiganteacordou

terça-feira, 21 de outubro de 2014

Top 8: Estranhamentos do dia a dia (parte II)

Bom, esse post, além de dividir com vocês estranhamentos do cotidiano francês, é também para mostrar algumas engenhosidades do pessoal daqui e, claro, as curiosidades que se apresentam para gente (algumas bem positivas, é claro).

1. O "caminhão de mudança":

Conforme já comentamos em outros momentos, os espaços físicos aqui tendem a ser bem pequenos (no elevador do prédio, por exemplo, cabe só duas pessoas, magras). Assim, como fazer uma mudança em espaços tão reduzidos? Ora! Pela janela!

Essa escada sobe e desce com a sua mudança lindamente encaixotada.

2. Carro elétrico para alugar.

Sabe as bicicletas aí de POA para alugar? Aqui tem também, há muito tempo. Mas sabe o que tem também? Carro para alugar em um sistema bem parecido, e ele ainda é elétrico! Aqui você pode ler (em francês ou inglês) como funciona. 


3. Prefeituras distritais

Aqui cada arrodissement tem uma prefeitura que é a responsável pelo bairro. Elas oferecem desde aulas de línguas e artesanato, até festinhas e feiras pelo bairro. E, claro, cuidam das pendengas diárias da mini-cidade que é cada bairro aqui.

Prefeitura do 15e, o nosso arrodissement.
4. As sacolinhas do super

Sabe aquela história de não usar sacola plástica no supermercado? Aqui eles levam a sério. Como? Cobrando a sacolinha no super, míseros 0,03 centavos, mas, principalmente, fazendo ela de PÉSSIMA qualidade. Assim, você acaba por sempre ter uma sacola esperta do Monoprix, ou do Leader Price, ou do Picard à mão. 

Sac transada do Monoprix (o Zaffari deles)
5. Nutella

Todos amamos: no pão, na colher e no crepe, claro. Eles amam tanto que você pode comprar Nutella de 1kg no super.

6. Aquecimento

Estamos no outono europeu e as temperaturas têm oscilado entre 12 e 20 graus, mais ou menos (parece o inverno de POA, mas sem umidade). Como o inverno aqui tende a ser mais frio do que isso, todos os lugares têm aquecedores, o que quase todo mundo já sabe. Mas os aquecedores são levados a sério demais por aqui: além de você ter eles em todos os ambientes do apartamento (a gente tem três em 40 metros/quadrados), e do prédio, ele está em todos os lugares! O único lugar que dá para sentir frio, por ora, é na rua mesmo. De resto, dá até para usar uma manga curta.

Os aquecedores são esses. O prédio é o responsável por ligar o central e a gente regula no apê se quer ou não, mas isso só a partir de metade de outubro, porque esses aquecedores não são nada ecológicos.

7. Água quente

Como eles levam o frio muito a sério, todas as torneiras/chuveiros tem a opção ESCALDAR na temperatura. Até para chimarrão essa água é quente demais, mas daí é só regular. Para lavar louça é uma delícia.

Do lado da bolinha azul, há uma bolinha vermelha, que não dá para ver muito bem, é ela a responsável pela água quente ou escaldante diária.

8. Lixo para garrafas.

Além de ser separado dos outros lixos, o lixo para garrafas está nos espaços públicos porque vai que você está passando com seu vinho/cerveja e precisa de um lixo?

Aquele círculo em branco é a "boca do lixo".
Alguns desses estranhamentos bem que podiam ser inseridos no nosso cotidiano brasileiro, gentes. Ia ser demais comer um pote de Nutella, lavar louça com água pelando, alugar um carro elétrico e jogar fora uma garrafa de vinho na lixeira para reciclar!