quinta-feira, 11 de setembro de 2014

Colonialismo francês - parte II

Escrevi recentemente um texto sobre o colonialismo francês e como ele estava apagado do museu do Quai Branly, que visitamos no domingo. Mas aí nos demos conta: não é só do museu que essa herança imperialista está escondida. Um bom lugar para ver um cadinho do império colonial francês pode ser visto nos supermercados e mercados de bairro de Paris.

Deixa eu explicar: ao contrário do Brasil, em qualquer vendinha francesa os produtos têm uma designação de preço/quilo, mas também da origem do produto. O leitor e a leitora podem até se perguntar: tá, mas e daí? Explico: a França tem algumas áreas rurais e uma parte dos hortifrúti são dessas regiões (principalmente as bandas lá de Auvergne, no centro-sul francês). Mas a maioria dos produtos vem de diferentes partes da Europa e do mundo.

Para ilustrar meu ponto, numa rápida ida ao supermercado, você pode encontrar:

·         Bananas da Etiópia
·         Laranjas da Espanha
·         Abacaxis da Costa Rica
·         Lentilhas do Marrocos
·         Tomates do Marrocos
·         Figos da África do Sul
·         Cebolas da Argentina
·         Mangas da Costa do Marfim



A lista segue e posso ir atualizando mais e mais para quem tiver interesse. Dá para dizer que alguns desses produtos fazem parte de regiões que nem sequer foram colonizados pela França – o que é verdade. Mas o mais interessante, contudo, não é nem tanto a região (afinal, a globalização tá tão in que chega a ser ‘fora de moda’). Mas o mais chocante é comparar preços mesmo. Os produtos são caros para os nossos padrões, mas baratíssimos para o francês normal. Imagine você, cidadão brasileiro comprando laranjas de Valencia, o quanto isso não ia lhe custar! O mesmo poderia se dizer de qualquer outro produto. Mas como “nessa terra, plantando tudo dá” a gente nem precisa recorrer aos hortifrúti das diferentes partes do mundo. Já na França, onde o verão é tipo um raio de sol que ilumina as cidades por duas semanas, o bicho pega e para compensar a falta de produtos, o colonialismo é uma alternativa.


Uma prova disso é exatamente saber como é caro o que é produzido numa vendinha, ou numa feira de produtos tipicamente franceses. O tomate francês custa a mesma coisa que o do Marrocos. Aparentemente é a mesma coisa...mas o francês tem época a ser consumido, enquanto o marroquino pode ser facilmente trocado por outros (eu vi por aqui alguns belgas também).

A Juliane disse que tem algo de positivo nisso. A gente acaba vendo a origem do produto e pode escolher se quer comprar, ou não. Tendo a concordar com ela, a ideia realmente permite conceber um consumo mais consciente (o que é bom). Mas por outro lado, se você não quiser consumir o produto mais barato (!!!), de melhor qualidade (!!!!!) e que tem o ano todo (!!1!1!!onze!!)... bem, o azar é teu. E esse é o problema: esses produtos continuarão a ser trazidos por preços baixíssimos para o bolso do consumidor francês – e não tão baixos para o consumidor brasileiro morando na França.

A parte mais zuera disso é que talvez ninguém ache que isso é “colonialismo”, não. É só o bom e velho livre-mercado agindo e operando. Isso rola no Zaffari, no Nacional, no Pão de Açúcar...e ninguém fala nada. Mas talvez esse seja o problema: uma ida num supermercado francês pode abrir olhos sobre duas coisas: sobre o colonialismo francês e sobre a sociedade de consumo brazuca.

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