quinta-feira, 13 de novembro de 2014

O Collège de France

Em outro post o Fernando já tinha falado e dedicado um parágrafo ao Collège de France, narrando as nossas desventuras em estudar numa terra diferente. A experiência tem lá suas limitações, mas conforme a gente vai conhecendo essa instituição, vamos ficando cada vez mais fãs dela.


Já falamos da variedade de cursos que o Collège oferece e de quão sensacional é essa ideia de um ensino livre para todos que assim desejarem. Não é como se tivéssemos descoberto a roda, pois a instituição existe desde 1530. Pelo que vimos, ele foi fundado pelo rei Francisco I e se originou numa disputa entre os humanistas franceses e os teólogos da Sorbonne. O resultado então foi a criação de um colégio gerido pela coroa francesa para dar conta de matérias que a universidade não queria; ou não tinha interesse em ensinar. Desde então, o Collège se orgulha de ser mais aberto que a universidade, possibilitando um espaço de discussão aberta com o público em geral. Mas a sua ideia primordial retoma a lógica de que você pode estudar gratuitamente um curso de nível superior, completamente financiado pelo Estado e, com a vantagem de que não tem nenhum processo de admissão. Ou seja, sem vestibular, sem testes. 

E, no meio da era da internet, a grande novidade é que o Collège tem várias palestras online para quem quiser ver elas, nos chamados "podcasts". Geralmente elas são em francês, claro e tem disponíveis no Itunes (mas fiquem tranquilos porque é de graça). O link para acessar os podcasts pode ser encontrado aqui.

A gente tem que salientar também que a variedade de cursos também é demais. Eles têm 57 professores que são "eleitos" entre a comunidade acadêmica francesa e eles devem oferecer os cursos que lhes interessam. Assim, cada professor se torna responsável por uma "cadeira", que oferece diversos cursos relacionados. Há também os professores honorários, os professores convidados... nós, que somos das humanas, achamos que não tinha nenhum curso ali que não faríamos - embora nenhum deles fosse, de fato, importante para as nossas respectivas teses.


Nem tudo são flores, claro. O Collège é uma instituição cheia de prestígio, claro, mas você não ganha nenhum documento oficial por ter realizado qualquer curso que seja na instituição. Mas como eu vou provar para minha entidade mantenedora que eu fiz um curso no Collège? Bem, isso não é um problema comum para os franceses. De fato, pelo que sabemos, aqui a neurose com certificados é bem menor. Se você afirma que fez determinado curso e frequentou determinada aula, as instituições acreditam (Oi!? Para quem está acostumado a DOCUMENTAR currículos para provar sua veracidade, é uma grande e quase ingênua novidade...). São poucas as instituições que garantem documentos oficiais de conclusão de curso - no geral, o único documento mais aceito são os diplomas mesmo. E como o Collège não é exclusivo, você ter feito um curso lá não é um diferencial para os franceses.

Aliás, o fato de não ser exclusivo é uma maravilha, mas é preciso se destacar uma coisa: são poucos os estudantes e trabalhadores franceses que tem tempo livre para se dedicar aos cursos (que geralmente ocorrem durante os turnos da manhã e da tarde). Trabalhador é trabalhador aqui também e, mesmo com uma jornada de trabalho mais curta, não rola de ir em curso do Collège de France na maior. Há um respeito, claro, pelo fato dele ser tão "radicalmente público" (durante o maio de 1968 francês ele permaneceu intocado, diferente da Sorbonne). E já os estudantes, bom...o que temos visto aqui é que os estudantes geralmente são trabalhadores mesmo. Dependendo da família, pode até ser que ela ajude os filhos, mas no geral eles se veem obrigados a entrar no mercado de trabalho - e a lei é bem rígida ao definir a jornada de trabalho dos estudantes franceses. Então, se não é o seu horário de aula, bem...a tendência é que não seja nada fácil fazer esses cursos.

Por conta disso, a maioria do público nas conferências e palestras que fomos é composta de simpáticos (bem, nem tanto) velhinhos. Nem sempre são loucos de palestra, mas no geral são pessoas que devem estar aposentadas e usam de seu tempo livre para participar desses encontros. A ideia da instituição é simples: um lugar para o livre-pensar. Não sabemos se chega a tanto, mas a ideia de um debate livre e que não está amarrado pelas regras da academia parece bastante interessante.

Tivemos oportunidade de assistir ontem a uma primeira aula (são três) do curso "A questão Palestina, o fim dos processos de paz (agosto de 2000 - fevereiro de 2001)" com o professor Henry Laurens, que é o responsável pelas "cadeiras" de História Contemporânea do Mundo Árabe. Depois desse curso ele ministrará outro, e assim por diante. Além dos cursos têm uma série de conferencistas ao longo do ano. Mês que vem, para os historiadores de plantão, tem Perry Anderson, por exemplo.  Mas as outras áreas também tem vez, claro: amanhã tem algum seminário sobre equações, segunda sobre antibióticos, e assim segue o baile.

No site do Collège você pode ver toda agenda, escolher o que lhe apraz e voilá! Bons estudos!

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