Ontem foi dia de louvar nossos mortos no Cemitério de Montparnasse. No mapa de entrada do cemitério constam cerca de 100 nomes de famosos enterrados ali e a nosso recorte sentimental coube os nomes de Simone de Beauvoir e Paul Sartre, Charles Baudelaire, Julio Cortázar, Émile Durkheim, Samuel Becket, Guy de Maupassant e Alfred Dreyfus, exatamente nessa ordem. De maneira geral os túmulos de famosos chamam atenção não pela arquitetura, mas pelos presentes deixados: bilhetes de metrô, livros, flores, recados, moedas, desenhos e beijos (a lápide de Simone e Paul é repleta deles). A exceção fica por conta do túmulo de Beckett que é bastante discreto.
Depois de uma tarde entre os mortos, optamos por uma noite tipicamente de sábado, ou seja, dia de tomar uma ceva, a primeira em Paris, visto que até agora só havíamos tomado um Bordeaux e um frisante Rosé que está super na moda aqui. Sempre que viajo para alguma capital do Brasil costumo perguntar aos nativos sobre o bairro boêmio deles. Em linhas gerais a pergunta seria: onde fica a Cidade Baixa de vocês? Assim, sempre que saio de casa procuro um lugar com aqueles ares da CB, mas de preferência sem aqueles Pedrinis e Donas Coisinhas que são padronizados demais. No fundo eu sempre procuro a CB dos meus vinte anos, com cerveja barata, buteco fuleiro e considerada um bairro "mais alternativo".
Assim, fomos parar no 11eme, meio por indicação de uma amiga que havia nos sugerido esse bairro para morar e também por indicação de um site que listava os 10 bares mais baratos de Paris, sendo que 3 se encontravam nesse distrito. Quando vimos isso pensamos: partiu! Descemos na estação Parmentier depois de umas duas "baldeações" de Montparnasse até lá. De saída da estação, muita "gente jovem reunida" e muitos bares com promoções de happy hours, que aqui pode começar à 13h e se estender até as 23h. Para se ter uma ideia do preço, o pint (copo) de cerveja, em média uns 450ml, custava de 3,5 a 6,5 euros, um preço bom para os padrões da cidade.
Fomos primeiro no Pili Pili por indicação do site que comentei, e adoramos: na entrada, uma foto da Laura Palmer e lá dentro, uma homenagem ao David Lynch.
Além disso, atendimento super bacana, com direito ao dono nos mostrando todo orgulhoso um cachaça cearense que ele tem exposta no bar. Somando a isso, uma trilha sonora punk rock americana bem aconchegante. Depois de pints por 4 euros, fomos comer um kebab delícia por 4,5 euros no Assoce, onde a Babel linguística se instalou, já que vocabulário para comida é sempre tenso, mas com a ajuda de um americano com um francês impecável tudo deu certo. . Alimentados, fomos atrás de outros bares, indo parar em um bar etíope (!) chamado Ethnika com mais pints por 4 euros e, por fim, para fechar à noite, mais um bar com pint por 4 euros. Nesse último ainda nos deparamos com a bandeira do Brasil exposta no balcão, dizem os donos que em função da Copa do Mundo. Curiosidade do bar: os donos, 3 jovens de 20 e poucos anos, se comportavam como clientes, ou seja, bebendo e fumando como todos os presentes, algo bem estranho para os padrões brasileiros.
Fora o fato dos preços honestos e de bares legais, o 11eme faz eu sentir aquilo que eu sempre espero de um bairro boêmio e alternativo: a sensação de estar em casa, afinal, "eu reconheço uma Cidade Baixa quando eu vejo uma" (In: PUREZA, Fernando. Setembro, 2014).
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